Apresentação
Olá! Esta é a quarta aula do Módulo I - Fonologia, Tonicidade e Acentuação. E hoje estudaremos três importantes conteúdos da Fonologia: o dígrafo, o dífono e os encontros consonantais. Ao final desta aula, recomendamos que você faça as nossas listas de exercícios antes de avançar o conteúdo.
O dígrafo
O dígrafo ocorre quando duas letras são pronunciadas com um único som/fonema. Em CHAPÉU, por exemplo, as letras “CH” são pronunciadas num único som, que tem o som de “x”, como se a palavra fosse escrita assim: “xapéu”.
O processo de formação do dígrafo se dá mediante o uso de letra diacrítica, que altera o som da outra letra. Voltando ao caso de CHAPÉU: a letra “h”, que sozinha não tem som algum, muda a pronúncia da letra “c”, que passa a ter som de “x”. Logo, a letra “h” é a letra diacrítica nesse caso. Ela apenas está ali para indicar que “c” tem som de “x”. Portanto, “chapéu” tem 6 letras, porém 5 fonemas (pois “ch” conta como um fonema).
|
Exemplos de dígrafos consonantais |
|||
|
Dígrafo |
Símbolo |
Exemplo |
Transcrição Fonética |
|
ch |
[ ʃ ] |
CHÁ |
[ ʃˈa ] |
|
lh |
[ ʎ ] |
PILHA |
[ pˈi.ʎɐ ] |
|
nh |
[ ɲ ] |
GANHAR |
[ gɐ.ɲˈaɾ ] |
|
rr |
[ ʀ ] |
BARRO |
[ bˈa.ʀu ] |
|
ss |
[ s ] |
PASSEIO |
[ pɐ.sˈɐj.u ] |
|
sc |
NASCER |
[ nɐʃ.sˈeɾ ] |
|
|
sç |
DESÇA |
[ ˈde.sɐ ] |
|
|
xc |
EXCETO |
[ eˈsɛ.tu ] |
|
|
gu |
[ ɡ ] |
FOGUETE |
[ fu.gˈe.ti ] |
|
qu |
[ k ] |
QUERO |
[ ˈkeɾu ] |
O dígrafo vocálico
Os dígrafos que vimos antes são formados por consoantes. Porém, é possível haver, também, dígrafos vocálicos. Eles aparecem quando ocorre a nasalização da vogal pelas letras “m” ou “n” (que funcionam como letras diacríticas).
Em TAMPA, as letras “AM” são pronunciadas num único som, como se a palavra fosse escrita assim: TÃPA. Logo, a letra “N” é diacrítica, pois altera o som da letra “a”, tornando-a nasal e formando dígrafo (AM = Ã).
|
Exemplos de dígrafos vocálicos |
|||
|
Dígrafo |
Símbolo |
Exemplo |
Transcrição Fonética |
|
am |
[ ɐ̃ ] |
TAMPA |
[ tˈ ɐ̃.pɐ ] |
|
an |
MANTO |
[ mˈ ɐ̃.tu ] |
|
|
em |
[ ẽ ] |
TEMPO |
[ tˈẽ.pu ] |
|
en |
VENTO |
[ vˈẽ.tu ] |
|
|
im |
[ ĩ ] |
LIMPO |
[ lˈĩ.pu ] |
|
in |
TINTA |
[ tˈĩ.tɐ ] |
|
|
om |
[ õ ] |
BOMBA |
[ bˈõ.bɐ ] |
|
on |
PONTE |
[ pˈõ.tɨ ] |
|
|
um |
[ ũ ] |
ZUMBI |
[ zũ.bˈi ] |
|
un |
FUNDO |
[ fˈũ.du ] |
|
Letra diacrítica
Conforme já vimos, a letra diacrítica é aquela que altera a pronúncia da outra letra, formando dígrafo. Na língua portuguesa, são letras diacríticas: h, r, s, c, ç, u (nos dígrafos consonantais); m, n (nos dígrafos vocálicos).
E por que estou explicando isso?
Resposta: porque em HOTEL, por exemplo, não há dígrafo em “HO”, pois a letra “h” não é letra diacrítica, visto que não está alterando a pronúncia de “o” (como acontece em chá, onde “h” altera o som de “c”, ou então em “linha”, onde “h” altera o som de “n”). O mesmo acontece em "hora", "hospital" e outras palavras do tipo (iniciadas com "h" mudo).
Portanto, a noção de letra diacrítica é muito importante para entender o dígrafo da forma correta.
O dígrafo e o ditongo
Os dígrafos “gu” e “qu” merecem
atenção especial: só serão dígrafos se realmente forem pronunciados num único som, sem distinguir o som de "u". Então o “qu”, por exemplo, será dígrafo quando for pronunciado com som de “k”, como na palavra "quero" (kero). Caso contrário, se a letra “u”
for pronunciada, então "qu" não será dígrafo, podendo formar ditongo com a vogal que
aparecer logo em seguida, como ocorre em "aquário" (akuário). A mesma atenção devemos ter com o "gu".
Veja os exemplos:
|
DÍGRAFO X DITONGO |
||
|
Exemplo |
Classificação |
Observação |
|
QUEIJO |
dígrafo |
“qu” é dígrafo, pois “qu” tem somente um som (“keijo”). A letra “u” não e pronunciada (não falamos “kueijo”, mas sim “keijo”) |
|
QUADRO |
ditongo |
“qu” não é dígrafo, pois a letra “u” é pronunciada na fala (“kuadro”), formando o ditongo “ua”. |
|
GUITARRA |
dígrafo |
“gu” é dígrafo, pois “u” não é pronunciado, fazendo com que “gu” tenha somente um som. Além dele, temos o dígrafo "rr". |
|
GUARANÁ |
ditongo |
“gu” não é dígrafo, pois a letra “u” é pronunciada na fala, formando o ditongo “ua”. |
|
QUANDO |
dígrafo vocálico (“an”) e ditongo (“ua”) |
em “quando”, “qu” não é dígrafo, pois a letra “u” é pronunciada; “an” é dígrafo vocálico “ã”; “uã” é ditongo, formado pela semivogal “u” e a vogal nasalizada “ã”. Ou seja: KUÃDU. |
Encontros consonantais
O encontro consonantal ocorre quando há o encontro de dois sons consonantais na mesma sílaba (encontro consonantal perfeito), ou então em sílabas diferentes (encontro consonantal imperfeito). Importante ressaltar que no encontro consonantal, ao contrário do dígrafo, cada consoante tem seu som.
Portanto, em PRATO, temos o encontro consonantal “pr”. Trata-se de duas consoantes (“p” e “r”) com dois fonemas (som de “p” e som de “r”). Já em CHAVEIRO, mesmo que “c” e “h” sejam consoantes, não temos encontro consonantal, mas sim dígrafo, pois as duas consoantes estão representando apenas um som (“xaveiro”).
Logo, é preciso prestar atenção aos sons envolvidos.
|
Exemplos de encontros consonantais |
Tipo |
|
|
OPÇÃO |
op-ção |
imperfeito (sílabas diferentes) |
|
FLANELA |
fla-ne-la |
perfeito (mesma sílaba) |
| APTIDÃO | ap-ti-dão | imperfeito (sílabas diferentes) |
|
ADVOGADO |
ad-vo-ga-do |
imperfeito (sílabas diferentes) |
|
BRAVO |
bra-vo |
perfeito (mesma sílaba) |
|
GLOBO |
glo-bo |
perfeito (mesma sílaba) |
|
ABDICAR |
ab-di-car |
imperfeito (sílabas diferentes) |
Encontro consonantal e o dígrafo
A análise do encontro consonantal deve ser realizada levando-se em consideração o critério sonoro. Portanto, na palavra GRANDE, temos somente um encontro consonantal “GR”. Não há encontro consonantal em “ND”, pois “n” é uma letra diacrítica (não tem som) e está nasalizando a vogal “a”, formando dígrafo vocálico com ela.
|
Palavra |
Transcrição (simplificada) |
Observação |
|
GRANDE |
GRÃDE |
“gr”: encontro consonantal perfeito “an”: dígrafo vocálico /ã/ |
O dífono
O dífono ocorre quando uma letra é pronunciada com dois sons (fonemas). Na língua portuguesa, isso ocorre quando a letra “x” tem som de “ks”, como em TÓRAX (“tóraks”), TÁXI (“táksi”), TÓXICO (“tóksico”), COMPLEXO (“complekso”).
Outros exemplos: fixo, anexo, toxina, reflexo, duplex.
Portanto, o dífono é um exemplo particular de encontro consonantal, pois se trata do encontro dos sons consonantais de /K/ e /S/ representados graficamente por única letra (“x”).
FIM DO CONTEÚDO
Opção 1: fazer lista de exercícios
Opção 2: voltar para a aula anterior - parte III (encontros vocálicos)
Opção 3: continuar a leitura abaixo (aprofundamento)
____________ PARTE II A P R O F U N D A M E N T O ____________
Pode haver encontro consonantal com mais de duas consoantes?
Resposta: sim.
Evanildo Bechara, em sua Moderna Gramática Portuguesa, define encontro consonantal como “seguimento imediato de duas ou mais consoantes de um mesmo vocábulo” (2019, p.79) e cita, como exemplo de encontro consonantal, o grupo de letras “stm” na palavra “istmo”. Trata-se de um encontro consonantal de três consoantes (“ist-mo”).
Na Novíssima Gramática da Língua Portuguesa, Domingos Paschoal Cegalla segue a mesma ideia, definindo encontro consonantal como a “sequência de dois ou mais fonemas consonânticos numa palavra” (2020, p.30). Um dos exemplos que o autor apresenta como encontro consonantal em sílabas diferentes é a palavra “obs-tá-cu-lo”, em que as consoantes “bst” não estão na mesma sílaba.
Outros nomes para a classificação dos encontros consonantais
Há gramáticos que denominam os encontros consonantais imperfeitos de encontros separáveis, ou disjuntos (já que ocorrem em sílabas separadas). E os encontros consonantais perfeitos podem ser chamados de encontros inseparáveis (já que ocorrem na mesma sílaba).
Por que LH é dígrafo?
Pergunta clássica: por que “lh” é dígrafo, se tem som de “li”?
Essa dúvida é comum, pois em certas regiões do Brasil, a pronúncia de LH se aproxima muito da pronúncia de “LI” ("família” X “familha”). Porém, para a Fonologia, esses sons são tratados como diferentes, ou seja: “lh” não tem o mesmo som de “li”.
Leia em voz alta os pares abaixo, comparando os sons:
LIA / LHA;
LIE / LHE;
LI / LHI;
LIO / LHO;
LIU / LHU.
Perceba que o som de "i" é mais destacado em "li" do que no dígrafo "lh". Portanto, “lh” tem um som mais particular e específico que se distingue de “li”. Trata-se, portanto, de dígrafo.
Por que os dígrafos existem e qual a origem deles?
De acordo com a Gramática Metódica da Língua Portuguesa, de Napoleão Mendes de Almeida, o dígrafo “corresponde a uma deficiência do alfabeto, ou seja, à inexistência de uma só letra para indicar som” (2024, p.63).
Segundo o autor, os dígrafos "ch", "lh" e "nh" não existiam no latim. Portanto, eles surgiram ao longo do tempo por meio de vários processos fonéticos.
O dígrafo “ch” originou-se de “pl” (ex: chuva veio de pluviam), “cl” (chave veio de clavem), “scl” (macho veio de masculum) e “fl” (chama veio de flammam).
O dígrafo “lh” veio do duplo “ll” latino e espanhol, como centelha (do latim scintillam) e embrulhar (do espanhol embrollar). Veio, também, do “l” latino que tinha a função de evitar hiatos, como mulher (do latim mulierem). O dígrafo “lh” também se formou a partir de quedas e combinações de letras, como abelha (da combinação “cl” do latim apiculam), telha (da junção “gl” do latim tegulam), entre outros casos.
Quanto ao dígrafo “nh”, de forma semelhante ao “lh”, surgiu a partir das palavras latinas em que “n” era usado para evitar hiatos, como os casos de senhor (do latim seniorem) e venho (do latim venio). O dígrafo “nh” também originou-se de “d” (como em ninho, do latim nidum), do duplo “n” (como grunhir, do latim grunnire) e da combinação “gn” (como em cunhado, do latim cognatum).
____________ R E F E R Ê N C I A S B I B L I O G R Á F I C A S ____________
ALMEIDA, Napoleão Mendes de. Gramática Metódica da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Ed. CDB, 2024.
AZEREDO, José Carlos de. Gramática Houaiss da língua portuguesa. 5.ed. revista. São Paulo: Parábola, 2021.
BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. 39.ed. rev. e ampl. atual. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2019.
CUNHA, Celso; LINDLEY, Cintra. Nova Gramática do Português Contemporâneo. 6.ed. Rio de Janeiro: Lexikon, 2013.
LIMA, Rocha. Gramática normativa da língua portuguesa. 48.ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2010.
Para consultar as referências gerais do
site, que embasam todos os conteúdos, acessar a página Nova Gramática On-line (Referências).
Muito bom
ResponderExcluir